quinta-feira, 20 de junho de 2013

Bien Venidos!

   
    Quase entro num anacronismo[1] ao caminhar pelas ruas da parte cinzenta de Montevidéu. Ou seja, estar no tempo presente e observar uma cidade cujo cenário é de fins do século XVIII e início de XIX.
É como um cenário de filme inglês na consolidação da Revolução Industrial, uma sensação quase realística, o cheiro, o tom, o barulho, a fumaça. As casas, praças, avenidas e prédios com arquitetura e construção "preservadas" daquela época. Alguns prédios com datas (acredito ser de sua construção), os desenhos das janelas, das grades, das portas (aquelas portas grandes e emolduradas) e as praças com os monumentos históricos e representativos. É realmente muito bonito! Estive lá no inverno, daqueles de sentir dores no maxilar ao sair pela manhã (aliás, se um dia você for ao Uruguai e estiver frio não experimente sair às ruas pela manhã ou tarde da noite sem uma touca, seus ouvidos e nariz irão doer, é um frio cortante). As folhas de plátano[2] secas pelo chão davam um toque todo especial ao ambiente e, claro, às fotos. Impossível ir a um lugar como esse e não tirar fotos. Foi fascinante!
Viajar para o Uruguai foi um sonho realizado. Fiquei na Ciudade Vieja, uma região menos abastada da cidade de Montevidéu, mas, muito receptiva e com um cenário encantador. Lugar de gente simpática (lembrando que falo da gente daquela região, lugar e pessoas simples), receptiva, sorridente, solidária e que gosta muito dos brasileiros (pelo menos foi o que constatei enquanto estive lá).
Não falava e nem escrevia em espanhol. Não, não! Fui na “cara e na coragem”, comprei um daqueles guias de conversação e o li alguns dias antes da viagem e só. Mas, não foi nada impossível, com o passar das horas e dos dias você começa a ficar habituado com o recepcionista do hotel, vendedores nas lojas, pessoas nas ruas, novos amigos e assim por diante, no fim começamos a compreendê-los (só não respondê-los tão bem como deveríamos.)
Eu estava lá, entre amigos, para participar de uma atividade muito boa de "capacitação" em liderança juvenil - CUMBRE / Especialidades Juveniles, realizada no prédio da Intendência Municipal de Montevidéu. Eu mesmo não conhecia a Cumbre, mas, quando ouvi um pessoal comentando sobre essa atividade dizendo que ela proporcionava a unidade entre jovens de várias idades, regiões, línguas e estilos, fiquei pensando como seria interessante conhecer pessoas diferentes as quais também servem a Cristo, adquirir novas experiências e vivencia-las. Essa reflexão só me fez ficar mais ansiosa e com vontade de conhecer o evento, os palestrantes, as bandas e tudo mais.
Assim decidi viajar e conhecer essas novas pessoas, lugares e o evento em si. As minhas expectativas foram superadas e aproveitei muito do tempo, do lugar, das atividades, as reuniões, os louvores, as bandas, tudo. Senti a presença de Deus de uma forma inexplicável, lembro que num dado momento, quando participávamos de uma dessas reuniões de adoração e louvor, os jovens deram as mãos uns aos outros, fecharam os olhos e começaram a cantar, chorar, se derramar e cada um nas suas respectivas línguas, era incrível, eu chorava e percebia como Deus é grande. Para Ele não há separação, não há língua, não há país, ali era um corpo, todos juntos adorando ao mesmo Deus. Era maravilhoso, não dá para expressar com palavras, só vendo e sentindo.
Assim como os louvores, as palestras foram maravilhosas. No começo eu fiquei com um pouco de dificuldade de compreendê-las, por causa do espanhol, mas, depois fui me acostumando e consegui até fazer anotações, memorizar e identificar perfeitamente as ideias. Numa das exposições o palestrante falou sobre as dificuldades de ser cristão nas transições da vida, especialmente da adolescência para juventude, as intempéries que passamos e como devemos superá-las, sabiamente. A partir dessa palestra Deus falou comigo num propósito muito importante que é sobre a maturidade e o enraizamento do cristão.
Um dos objetivos da Cumbre (e deve ser o nosso em qualquer lugar do mundo) é educar os jovens no caminho certo[3], auxiliá-los como e quando devem agir em determinadas situações. Ou seja, orientá-los (com embasamento bíblico) a refletir de forma consciente sobre as atitudes e suas consequências (sejam boas ou más) [4], compreender o sentido de cultuar, de ser cristão, ter/ser um bom testemunho, entender a razão de sua existência e aceitar os planos e vontades de Deus[5]. É preocupante quando vemos uma geração passando sem que alguém lhes ensine, lhes advirta, lhes eduque, lhes “discipule”, sendo, portanto jovens sem base, sem orientação e sem direção. A responsabilidade está sob nossas mãos, Deus nos incumbiu a missão do “Ide”[6] e cabe a nós entender que pregar o evangelho vai além de “citar a bíblia” às pessoas, de dizer quais e quantos versículos as condenam ou as protegem, como se a bíblia devesse servir de “amuleto. Educar o jovem, no caminho que deve andar, é discípulá-lo, é ensiná-lo a meditar e compreender as escrituras, praticar o que Jesus ensinou, fazendo com que se tornem enraizados (embasados) e maduros.        
Mas, você pode estar se perguntando “O que é estar enraizado e como me tornar maduro?”. Há uma passagem bíblica que diz: “Qualquer que vem a mim e ouve as minhas palavras, e as observa, eu vos mostrarei a quem é semelhante: É semelhante ao homem que edificou uma casa, e cavou, e abriu bem fundo, e pôs os alicerces sobre a rocha; e, vindo a enchente, bateu com ímpeto a corrente naquela casa, e não a pôde abalar, porque estava fundada sobre a rocha. (Lucas 6:47 e 48). Esta passagem fala sobre a diferença do homem que construiu a casa na areia e o que construiu a casa na rocha. Perceba que os dois homens tiveram a mesma oportunidade de construir a casa, porém, um preferiu se acomodar sobre o superficial (a areia), imaturo e sem raiz, enquanto o outro optou por cavar, cavar e ir a fundo até achar a base (a rocha), enraizado. Ou seja, a diferença não estava no terreno, este era o mesmo, a diferença estava na ação dos homens.
Trazendo isso para nossa vida entendemos que o homem que construiu sua casa na areia decidiu viver na superficialidade (da areia), sobre o imediatismo, o comodismo, aquilo que dá menos sacrifício, que é mais fácil, mais rápido, sem renúncia e sem o peso da cruz[7]. Não podemos ser jovens imediatistas, acomodados, sem fundamentos e sem raiz[8]. O que acontece com uma árvore quando esta não aprofunda sua raiz na terra? Ela está sujeita às tempestades, seca com facilidade, não dá frutos, morre e cai. O mesmo acontece conosco quando não estamos enraizados em Cristo, perdemos as forças e ficamos mais vulneráveis ao pecado, ao desânimo e dependendo sempre de “tempo bom”. Mas, as nossas habilidades, a nossa fé, coragem e força são verdadeiramente usadas/provadas quando passamos por momentos difíceis e para vencermos precisamos estar inteiramente ligados em Cristo. A árvore que mais resiste ao tempo e seus reveses são as que têm a raiz mais aprofundada na terra, mesmo que o vento a balance ela não cai, assim como a casa alicerçada na rocha. Devemos ter um enraizamento relacional[9] com Cristo, nos ligarmos a ele de tal forma que sejamos um só e isso significa sermos mais parecidos com ele do que com nossas vontades. Andar com Cristo, cantar com Cristo, namorar com Cristo[10], viver com Cristo o tempo todo e não apenas nas reuniões na nossa igreja. Cultuar a Cristo em todos os momentos da nossa vida, estudar a sua palavra e assim buscarmos o enraizamento, igual o homem que decidiu cavar, que viu à frente, viu que as tempestades (problemas) viriam e que para ficar firme precisava de base (raiz). Mesmo que isso nos exija trabalho, renúncia e dedicação. Ser Cristão não é e nunca foi sinônimo de vida fácil[11], de vida ganha, superficial, mas, de sofrer por amor a Cristo, de buscar “perfeição” aquilo que Paulo chama de maturidade. [12]


[1]Uso essa expressão no seu sentido histórico: O anacronismo ou anticronismo consiste basicamente em utilizar os conceitos e ideias de uma época para analisar os fatos de outro tempo. Em outras palavras, o anacronismo é uma forma “equivocada” onde tentamos avaliar um determinado tempo histórico à luz de valores que não pertencem a esse mesmo tempo histórico. Até mesmo avaliar objetos de um determinado período à luz do que entendemos por arquitetura do atual tempo.
[2] Plátanos são árvores típicas dos climas subtropical e temperado. No geral, são árvores de interesse ornamental, podendo atingir mais de 30 metros de altura. Possuem folhas lobadas semelhantes às do bordo, que ficam avermelhadas no outono antes de caírem no inverno.
[3] Educa a criança no caminho em que deve andar; e até quando envelhecer não se desviará dele. Provérbios 22:6
[4] Alegre-se, jovem, na sua mocidade. Seja feliz o seu coração nos dias da sua juventude. Siga por onde seu coração mandar, até onde a sua vista alcançar; mas saiba que por todas essas coisas Deus o trará a julgamento.
Eclesiastes 11:9
Todas as coisas me são lícitas, mas nem todas as coisas convêm. Todas as coisas me são lícitas, mas eu não me deixarei dominar por nenhuma.
1º Coríntios 6:12
[5] Rogo-vos, pois, irmãos, pela compaixão de Deus, que apresenteis os vossos corpos em sacrifício vivo, santo e agradável a Deus, que é o vosso culto racional. E não sede conformados com este mundo, mas sede transformados pela renovação do vosso entendimento, para que experimenteis qual seja a boa, agradável, e perfeita vontade de Deus.
Romanos 12: 1-2.
[6] E disse-lhes: Ide por todo o mundo, pregai o evangelho a toda criatura. Marcos 16:15
[7] E dizia a todos: Se alguém quer vir após mim, negue-se a si mesmo, e tome cada dia a sua cruz, e siga-me. Lucas 9:23
[8] "Eu sou a videira; vocês são os ramos. Se alguém permanecer em mim e eu nele, esse dará muito fruto; pois sem mim vocês não podem fazer coisa alguma.
Se alguém não permanecer em mim, será como o ramo que é jogado fora e seca. Tais ramos são apanhados, lançados ao fogo e queimados. (I João 15. 5:6)
[9] De relacionamento. Relacionar-nos com Cristo de forma que ele seja o nosso melhor amigo e estarmos ligados como se fôssemos irmãos gêmeos inseparáveis.
[10] Namorar com, na língua portuguesa, é namorar em companhia de alguém. Namorar A alguém é namorar essa pessoa. Sendo assim, namorar A alguém COM Cristo ao nosso lado.
[11] Porque aquele que quiser salvar a sua vida, perdê-la-á, e quem perder a sua vida por amor de mim, achá-la-á.
Mateus 16:25
[12] A palavra perfeito é traduzida no grego como maduro, desenvolvido.